Demorou um pouquinho mas chegou a cobertura OutraCostura dos desfiles que aconteceram no Rio Moda Hype, evento de novos criadores que abriu o Fashion Rio Verão 2010 na última sexta.
Pra quem ainda não conhece o projeto, ele funciona como um concurso, onde todo ano marcas recentes no mercado devem se inscrever para tentar conseguir uma vaga nas sessões que o RMH realiza já há alguns anos dentro do FashionRio. Como o próprio FashionRio vêm mudando, talvez seja a hora do formato do RMH mudar um pouco, pois ao mesmo tempo em que algumas marcas ainda o encaram o evento como um concurso, criando coleções extremamente presas aos croquis da inscrição, ao mesmo tempo já vemos marcas (que já participam a mais edições) olharem mais para o consumidor e para a sua identidade, demonstrando um amadurecimento perto dos iniciantes.
Mudando ou não, uma coisa é certa, o RioModaHype é a plataforma mais importante do Rio e não deve deixar de existir, aconteça o acontecer na gestão de Paulo Borges, principalmente por ser o evento mais representativo que temos, pois são desfiladas coleções de estilistas de vários estados do Brasil. Por essas e outras, e pelas roupas que veremos à seguir, é que o OutraCostura têm o prazer de comentar todos os desfiles.
Corrente de Criação A estilista Julia Valle (MG), destaque duplo ano passado na sua estréia no RMP e como parte da equipe da marca Printing, trouxe nesta edição (fotos acima) um estudo sobre os movimentos de massas de ar em edificações, que inspiraram o processo de construção de suas peças, modeladas a partir de desenho livre (moulage) e continuando o trabalho com o programa Generator, que gera modelagens alteradas que Julia re-constrói e constrói assim uma identidade pro seu trabalho. Foi uma coleção de muitas cores, mas em tons bem gostosos de usar: branco, vermelho, amarelo, laranja e azul. Senti falta da boa estamparia da última edição, mas apareceram bordados e aplicações cheios de personalidade, como é caso do incrível blazer com a frente enviesada que Julia criou, um futuro must-have de verão em Belo Horizonte.
Cores de Almodóvar Martins Paulo (PI), que deve se chamar Paulo Martins, trouxe na sua segunda participação no RMP uma aula de coordenação de cores e estampas (fotos acima). Sua inspiração, o kitsch e as cores do cineasta Pedro Almodóvar em uma pegada de punk 80. Todo mundo poderia esperar uma catástrofe, mas o estilista fez ótimos recortes, combinações e volumes localizados. A mistura de estampas chega a ser inacreditável, assim como as misturas de cores como azul, verde, vermelho e preto na mesma peça, mas tudo funciona, mostrando bem o estilo e a perspicácia de Martins Paulo, que é visível desde suas coleções mais antigas que a gente encontra no seu blog-loja. Nota curiosa: A Salinas também desfilou no último sábado uma coleção inspiradas na cores de Almodóvar, sinal que nesse verão o kistch deve ser o novo geek (hehe).
Rockin the Jungle Rique Gonçalves (RJ) é um dos estilistas mais antigos do evento, têm loja própria e alguns pontos de venda no Rio, e talvez por isso já mostre uma maturidade comercial com a sua marca R.Groove. Nesta edição, inspirado pela música The Jungle, do Kiss, Rique decidiu juntar selva e rock, e o resultado é uma alfaiataria bacana, que vai do estilo safari ao rocker. Tem tênis com aplicação de tachas e também chapéu de caçador à moda Santos Dumont (amassados). Na cartela: cinza, um amarelo apagado, tons de areia e marrom e tons technicolor que aparecem no final, na divertida estampa de onça marrom-verde cítrico e no blazer/colete em listras, com direito a camiseta do Kiss. Foi bem discreto, mas a R.Groove também entrou na onda ‘masculino-femimino’, com a blusa longa branca com debrun cinza que veio por baixo de um blazer, e no macacão cácqui com bolsos laterais.
Pescaria Inteligente A estilista Fernanda Yamamoto (SP) abriu os desfiles do RMP com a idéia de misturar pescaria e geometria (fotos acima). Da pescaria, surgiu uma estampa delicada criada a partir de uma imagem de iscas e penduricalhos em formato de peixe. Da geometria, as linhas retas e as estampas gráficas, e a origem das formas usadas nas construções (através de moulage). Em tons nude e delicados, Fernanda soube dosar comercial e conceitual em peças de tule, cetim, cambraia e tricot, mas um interessante destaque foi um dos acessório da coleção, uma bolsa-chapéu-objeto-de-design que deu super certo.
Como atrair seu amor A dulpa de estilista Lô Rosado e Rê Vieira, que juntaram seus apelidos carinhosos e criaram a Lore (PE), se inspiraram nos símbolos populares para atrair a sorte e o amor, como trevos, fitas coloridas, elefantes e biscoitos da sorte, e esses foram os elementos usados para criar o melhor do desfile, as estampas (fotos acima). Infelizmente, para uma semana de moda, a dupla não trouxe nada de novo em suas peças de seda, tricoline, linho e malha, e nem ousou criar recortes (que mudariam um pouco a estamparia) . Mas, olhando por outro lado, as meninas não deixaram de criar peças que podem ajudar a mulherada a atrair um namorado.
Pijama com colete A Jotadê (SP), das estilistas Juliana Totti (Jota) e Daniela Okamura (Dê), nessa estréia bem que poderia se chamar de DegraDê, pois trouxe uma coleção apenas em branco e tons de cinza. Mas também tinham elementos da alfaitaria masculina, suspensórios, e homens delicados, inspirados por filmes da Nouvelle Vague. Tirando um maiô frouxo que eu não entendi, o resto da coleção foi bem estruturado, finalizando com uma mistura de alfaiataria e underwear, com um look de coletinhos e um calcinha em risca de giz.
Masculinos Tendenciosos O estilista Alisson Rodrigues (PR), que trabalha como assistente/modelista na Mulher Elástica (marca que eu adoro), pensou no universo da construção civil e trouxe um compacto do que vem acontecendo na moda masculina, com estampas coloridas, uma camisaria bem feita e um linha jeanswear bacana (foto 01) pra uma marca ainda iniciante, mas eu particularmente preferia que fosse sem respingos de tinta. Já a Butch (RS) é uma marca de beachwear masculina com certa visibilidade estrangeira e loja virtual, e na sua segunda participação no RMP atrelou elementos de gala ao universo da praia, com estampas de phyton, aplicação de canutilhos, degradê de tons de cinza e gravatas borboleta em lycra (foto 02). Comercial demais, a coleção acabou trazendo peças complementares simples, o que apagou o trabalho pensado para as sungas, por sinal bem pequenas em alguns casos.
Femininos Vencedores O estilista Vitorino Campos (BA), considerado um dos novos nomes promissores da moda baiana e vencedor do último concurso de novos talento do Barra Fashion Bahia , mostrou que sabe vestir uma mulher com tecidos e cores elegantes (foto 01), mas deixou passar um pouco mais de assinatura e uma cartela com mais cores. Já a premiada do ano passado no RioModaHype, Stefania (DF), decidiu entrar no universo cubista e acertou na construção de algumas peças como uma saia balonê (foto 02) e ombreiras, mas errou ao escolher, para um desfile tão pequeno, silhuetas e modelos semelhantes em vários looks, o que deixou a coleção sem diversidade.
Roupa, Conceito e Assinatura A recém-formada Bruna Ribeiro (SP) olhou para o workwear de garis, faxineiros, operários e decidiu reinterpretá-los para um estilo, diríamos, meio osklen (foto 01), trazendo regulagens, peças dupla-face e a multifuncionalidade, esses itens que infelizmente não foram vistos claramente na passarela, além de cores quentes e entradas em dupla que não agradaram muito. Inspirada pelas Cosmovisões, ou a perspectiva científica e holística do desenvolvimento de espécies (hã?), a estrante Úrsula Félix (BA) trouxe uma coleção quase só de curtos (foto 02), e apenas uma calça. Com toda a complexidade do tema, a estilista esqueceu de elaborar mais na modelagem, assim como na assinatura pessoal, pois admito que em alguns momentos achei que o desfile era do Rober Dognani.
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Fotos: Charles Naseh (Chic)